quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Dois Mundos



Tinha tudo para ser um dia comum. Acordei disposta e fui para a caminhada matinal, com meu fone de ouvido escutava uma música qualquer. Naquele dia eu tinha decidido fazer uma trilha desconhecida, apesar de disposta eu estava cansada de trilhar o mesmo caminho, passar todos os dias pelas mesmas pedras, algumas até que me fizeram tropeçar.
Eu estava totalmente alheia, entregue a sorte e não ocultarei que tinha medo de me perder.
Algumas vezes um amigo me acompanhava na trilha, mas nesse dia ele havia tido complicações; tropeçou na pedra que sempre me alertava para não tropeçar. Eu esperaria ele voltar a boa forma, mas ele não me deixou esperá-lo; disse que eu não poderia parar minha caminhada, que ele ficaria bem; mas não me deu esperanças que caminharia comigo. Eu então segui.
Demorei, mas segui em frente. Por vezes eu insistia com ele, dizia costumeiramente que eu estaria ao seu lado e que seguraria em suas mãos, que poderia ir à frente para avisá-lo sobre a possibilidade de algum tropeço em nosso caminho; trouxe a proposta também de ir ao seu lado, segurando em suas mãos e ajudando a ultrapassar as dificuldades e dando-lhe a certeza que não deixaria que uma possível queda lhe conduzisse ao chão, mas ele não quis seguir comigo.
Depois de muito insistir ele me disse que antes de caminhar comigo já havia caminhado por aquela trilha; confessou-me como que com a voz cortante que ao seu lado havia uma promessa de segurança, tal como a minha, de proteção, cuidado e apoio. Mas não foi como ele esperou. Ele tropeçou; fez-me saber que não era a primeira vez que ele tinha complicações.
Por um tempo ele desistiu de fazer trilha, trancou-se em um mundo que ele mesmo projetou e viveu por lá até deduzir que estaria preparado para caminhar novamente.
E foi em um dia como outro qualquer que me encontrou no inicio da caminhada. Não foi algo comum, pois apesar de estar na mesma estrada iríamos para um destino distinto. Desconhecíamos, mas ao final da estrada nos encontraríamos, eram dois caminhos e uma só chegada.
E foi naquele dia que tudo começou.
A partir daquele momento começamos a caminhar juntos, sabíamos que teríamos o mesmo final, mas escolhemos andar na mesma trilha. Por vezes íamos lado a lado, outras ele caminhava à frente; dizia que queria evitar que eu tivesse algum tropeço indesejado. Outras vezes por qualquer motivo menos importante eu caminhava só. O tempo foi passando e juntos descobríamos os segredos daquele caminho.
Na manhã comum ele tinha me dito que não iria caminhar comigo. Mas pediu que eu prometesse que iria só.
Decidi seguir. Estava com medo de seguir naquela nova trilha, desconhecia os perigos daquele caminho até que avistei ao longe uma folha presa em uma árvore. Desejei parar e ler o que ali estava, mas como estava um pouco tensa em seguir. Algum tempo depois o desejo foi maior e como eu já tinha passado por lá, conhecia o caminho e voltei.
Retirei o papel da árvore e logo reconheci aquela letra; ele havia passado por ali, aquela estrada não era desconhecida para ele. Marcado na árvore estava duas letras, a primeira letra era do nome dele, mas a segunda letra eu não conhecia. Não me contive e li o que ali estava escrito. Foi então que eu descobri que foi ali que ele havia tropeçado e se machucado; ele sabia que um dia qualquer ele não estaria mais ao meu lado por motivos que ainda eu não sei, mas não quis me deixar sujeita a tropeços. Aquele era o caminho do amor. Amor desconhecido que o fez tropeçar.
No final da estrada, dizia ele, eu poderia cair também; por isso desejou me privar. Ele havia declarado ali que jamais entraria por um caminho desconhecido, que se arrependia e se sentia um menino imaturo em achar que poderia seguir por um caminho tão complicado e tão imprevisível que é o caminho do amor. Mas eu...
Eu dobrei o papel e segurei forte nas mãos, continuei a minha caminhada lamentando que não pudéssemos conhecer aquele caminho juntos e de mãos dadas.



7 xícaras:

José Junior disse...

Minha sobrinha querida,
Se alguém deixar você seguir sozinha estará errando tanto quanto deixar de caminhar.
Beijos do tio!

Rute & Bruno disse...

Que você encontre alguém para caminhar ao seu lado, e que te impeça de tropeçar.

Boa sorte!

Unknown disse...

Chorei. Que lindo! Bem, eu continuo achando que o amigo vai ter que correr muito para alcança-la. :)

Beijos.

Amo.

Anônimo disse...

Cheio de emoção o seu texto. Fiquei sem palavras. Consegui beber frase por frase, palavra por palavra. Nunca li algo tão inspirado e cheio de paixão.
Parabéns!
E eu concordo com o comentário que disse que tão errado quanto deixar de caminhar é permitir que você siga sozinha.

will disse...

Um dos melhores textos seus que já li. Sem dúvidas.

Metafora linda!

Beijos!

Paah disse...

Passar um tempo sem passar por aqui me poupou de belos textos.
Ainda bem que eles não cessam.
Esse, assim ou um tanto mais do que os outros, ilustra a tua alma tão frágil e doce, menina.
A metáfora foi lindamente bem empregada.
E eu não me canso de ler.

Renato Ziggy disse...

Engraçado que até dado momento achei que fosse uma parábola. Como Will disse, bela metáfora. Gosto dessas alegorias. Me tocam. Me colocam pra pensar. E você fez isso muito bem!
Beijos!
Zy